Paul Vunak conta que entrou na “Kali Academy” por volta de 1976/1977. Naquela época, Bruce Lee já havia falecido fazia alguns anos (1973), e Dan Inosanto — seu principal discípulo — estava desorientado e deprimido. Sem saber bem o que fazer, Dan abriu uma pequena turma no quintal de casa.
Por incentivo de amigos próximos, como Richard Bustillo, percebeu que seria melhor abrir uma escola oficial, para perpetuar e expandir o que havia aprendido de Bruce. Assim, em 1974 nasceu a Filipino Kali Academy, que no início não passava de uma garagem ampla com chão de cimento.
Mas esse espaço se tornaria um verdadeiro campo de batalha. Pessoas de diferentes estilos, escolas e até países apareciam todas as noites para lutar. O ambiente era intenso, competitivo, muitas vezes hostil até entre os próprios alunos. Vunak descreve que havia noites em que mal suportava metade da turma, mas ainda assim comparecia ansioso para os treinos.
A última arte que Bruce Lee e Dan Inosanto haviam estudado juntos antes da morte de Bruce era o kickboxing. Na década de 1970, o termo ainda era desconhecido pela maioria. Enquanto a maior parte dos praticantes nos EUA treinava karatê rígido e coreografado, na Kali Academy começava a se formar um ambiente voltado para o combate real.
Pouco depois, Dan trouxe Ajarn Chai Sirisute, que apresentou oficialmente o Muay Thai ao grupo. Essa nova arte impressionou por sua eficácia: chutes baixos devastadores, clinch, joelhadas e cotoveladas mudaram completamente o panorama.
Vunak relata que, quando desafiantes de outras academias apareciam, o desfecho era sempre o mesmo: recebiam inúmeros chutes nas coxas, tentavam avançar com alguns socos, eram clinchados e castigados com joelhos. Se a luta caísse no chão, havia apenas um breve momento de resistência, e logo todos voltavam a se levantar — ainda não havia um estudo sólido do jogo de chão.
Paul Vunak descreve seu primeiro treino com Rorian Gracie: após alguns minutos, já estava dominado no chão, sem qualquer recurso. Ele lembra que saiu daquele treino arrasado, chorou no caminho para casa e se sentiu violentado pela facilidade com que foi neutralizado.
Determinando a não repetir a experiência, mergulhou de cabeça no jiu-jitsu brasileiro. Passou a treinar de quatro a seis horas por dia na garagem da família Gracie, cuidando das crianças e convivendo intensamente com Royce e outros membros da família. Em pouco tempo, alcançou um nível equivalente a faixa marrom.
Mas ao enfrentar os mestres mais velhos, como Hélio Gracie, percebeu que ainda estava distante da maestria: em segundos era finalizado por homens de 70 anos. Essa percepção o fez entender a profundidade da arte e consolidou o jiu-jitsu como parte obrigatória da formação da Kali Academy.
Mais tarde, o próprio Dan Inosanto mergulhou nos treinos. Vunak acordava às 4h30 da manhã para cruzar Los Angeles e dar aulas de jiu-jitsu para Dan, junto com Tom Cruise (não o ator, outro aluno). Em poucas semanas, Dan já apresentava nível de faixa roxa. Depois, passou a treinar com os irmãos Machado, conquistando sua faixa preta e tornando-se o praticante mais idoso a recebê-la nos EUA.
Com o tempo, a Kali Academy começou a formar um sistema híbrido que, em meados de 1985, já parecia com o MMA moderno. Em um treino qualquer, observadores veriam alunos em pé trocando golpes, entrando em clinch, aplicando quedas, jiu-jitsu com ground and pound. Uma visão que só seria popularizada anos depois com o UFC, fundado em 1993.
Mas ali, já em 1985, a mistura estava consolidada.
Segundo Vunak, as artes que formavam a base eram:
Muay Thai — socos, chutes, clinch e resistência.
Jiu-Jitsu Brasileiro — domínio do chão e finalizações.
No entanto, rapidamente perceberam que poderiam melhorar essas bases:
O Savate (boxe francês) trouxe chutes rápidos, precisos e difíceis de segurar, criando ângulos que surpreendiam até praticantes de taekwondo. Vunak chegou a abrir a primeira escola de Savate nos EUA junto com Daniel Duby, após ser nocauteado por ele em um sparring.
O Wing Chun contribuiu para refinar o clinch de Muay Thai, ocupando a linha central e tornando-o mais compacto e eficiente. Também introduziu a pressão linear (straight blast) e os traps (armadilhas), aplicáveis quando o adversário bloqueava golpes.
Além das artes esportivas, Vunak enfatizava a necessidade de se preparar para o confronto real. Para isso, incorporou:
Kino Mutai: técnicas de sobrevivência extrema, como morder e atacar os olhos, elevando o jiu-jitsu a um nível de autodefesa realista.
Kali/Armas Filipinas: inicialmente o foco era no princípio do defang the snake — destruir ou incapacitar os membros do oponente (braços e pernas) antes de aprofundar em combinações avançadas com bastões e lâminas.
Paul Vunak passou a chamar essa combinação de Contemporary Jeet Kune Do. A ideia era unir o que cada arte tinha de mais eficiente em situações de combate real:
• Base: Muay Thai + Jiu-Jitsu Brasileiro.
• Aperfeiçoamento do Muay Thai: Savate + Wing Chun.
• Aperfeiçoamento do Jiu-Jitsu: Kino Mutai.
• Complemento: Kali/Armas Filipinas.
Esse sistema foi Contemporary Jeet Kune Do, uma continuação direta da filosofia de Bruce Lee, que pregava a constante evolução e adaptação das artes marciais para a realidade do combate.
A trajetória narrada por Paul Vunak mostra como a Inosanto Academy foi pioneira na integração de diferentes artes marciais, antecipando o conceito de artes mistas quase uma década antes do UFC.
Mais do que uma fusão de estilos, o JKD Progressivo buscava a eficácia absoluta, unindo esportes de contato, artes tradicionais e técnicas de sobrevivência. Essa visão inovadora fez de Paul Vunak uma das figuras mais importantes na evolução contemporânea do Jeet Kune Do.